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Analfabetismo Funcional Digital: A Geração que Clica Sem Compreender

Por Antonia Braz

Vivemos na era da conectividade plena. Smartphones, inteligência artificial, redes sociais, aplicativos educativos, bibliotecas digitais — tudo ao alcance de um toque. No entanto, um dado divulgado recentemente pelo Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) lança um balde de água fria sobre essa aparente revolução: o analfabetismo funcional no Brasil não apenas persiste — ele está rejuvenescendo.

Segundo o novo relatório do Inaf, 16% dos jovens brasileiros entre 15 e 29 anos são analfabetos funcionais. Ou seja, embora saibam decodificar palavras e frases, não conseguem compreender plenamente o que leem, nem realizar operações matemáticas básicas aplicadas ao cotidiano.

 Estamos falando de jovens que cresceram cercados de tecnologia, mas que não dominam as competências fundamentais para se posicionar criticamente diante do mundo. O analfabetismo funcional, antes associado às gerações mais antigas e aos cenários de exclusão escolar do passado, agora veste roupas novas: tênis modernos, celular na mão e uma bolha digital que mascara a fragilidade da compreensão.

Esse fenômeno expõe uma contradição preocupante: o acesso à informação nunca foi tão democrático, mas a capacidade de compreendê-la permanece elitizada.

A educação brasileira parece ter estacionado. Desde 2018, os índices não avançam. Hoje, 29% dos brasileiros entre 15 e 64 anos não têm letramento suficiente para interpretar um texto simples ou resolver uma conta do dia a dia. Mais alarmante ainda é saber que 17% dos que concluíram o ensino médio e 12% dos que chegaram ao ensino superior também estão nesse grupo.

Estamos diante de um sistema educacional que forma diplomas, não pessoas preparadas para a vida. Que entrega certificados, mas não garante competências. Onde a tecnologia virou vitrine para discursos de inovação, mas não acompanha o alicerce do letramento. Troca-se o giz por tablets, mas não se troca a lógica de ensino bancário, repetitivo e desconectado da realidade dos estudantes.

O estudo revela um dado irônico e cruel: 95% dos analfabetos funcionais têm baixo desempenho em atividades digitais. Isso significa que não basta entregar tecnologia se não houver compreensão.

O problema não é o acesso — é a falta de estrutura cognitiva para processar, refletir, questionar e decidir. O saber técnico pode ser útil, mas sem o saber interpretativo, ele se torna superficial.

Estamos criando uma geração que sabe navegar em aplicativos, mas não entende uma cláusula contratual. Que sabe postar nas redes, mas não distingue fato de opinião. Que consome conteúdo em larga escala, mas não retém sentido. Conectados ao mundo — mas desconectados de si mesmos e da realidade.

Se quisermos evitar um colapso silencioso, é urgente recolocar a educação no centro do debate — não apenas como política pública, mas como prioridade cultural. É preciso alfabetizar de verdade, formar leitores críticos, desenvolver raciocínio lógico, fomentar o pensamento autônomo. Sem isso, o Brasil continuará a iludir-se com uma modernidade de fachada, enquanto permanece prisioneiro de um analfabetismo estrutural e silencioso.

O futuro não se constrói com telas. Constrói-se com compreensão. E, hoje, ela nos falta.

Antonia Braz é Diretora Presidente do Instituto AGC- (Apoiando Gente a Crescer) , psicanalista, pedagoga e especialista em Terapias Integrativas. Possui formações em Gestão e Mediação de Conflitos, Pedagogia Sistêmica, Neurociência e Psicologia Positiva. É Master em Programação Neurolinguística e atualmente cursa Mestrado em Neurociência na Enber University, nos Estados Unidos.

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