De acordo com um estudo nacional divulgado recentemente pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o tráfico de pessoas é uma das atividades mais lucrativas do mundo e movimenta aproximadamente US$ 32 bilhões por ano. Mesmo assim, ainda é ausente no Brasil uma lei especifica sobre antitráfico, são apenas artigos dispersos no Código Penal.
As principais vítimas que sofrem essa brutalidade têm características comuns: uma história de vida triste e de exploração aliada à necessidade financeira. A Pestraf (Pesquisa Nacional sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes), realizou um estudo em 2002, onde mapeou 241 rotas de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual no Brasil: 131 internacionais, 78 interestaduais e 32 intermunicipais.
Mesmo com todos esses dados alarmantes, o assunto sempre foi um tabu, que conseguiu ser quebrado através da atual novela das 21h da Rede Globo, “Salve Jorge”. A autora Glória Perez narra em sua trama a história de garotas traficadas e de como age a quadrilha responsável pela violência.
A novela popularizou o assunto, mas a verdade é que ele sempre existiu de maneira invisível aos olhos da sociedade. Desde 1533, quando negros africanos chegaram ao Brasil para fins laborais, já conta como tráfico humano e essa história, apenas, vem se remodelando.
O último levantamento do Departamento Penitenciário Nacional, ligado ao Ministério da Justiça, aponta que em junho de 2012 havia apenas 78 acusados de tráfico humano – interno e internacional – entre os quase 550 mil presos nas cadeias brasileiras.
Um dos motivos apontados pela baixa punição e a dificuldade em conter o crime é abordado pela psicóloga Anália Belisa Ribeiro, ex-coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria Estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, em entrevista à Marie Claire Online, que a maior parte das vítimas passam pelas rodovias, onde não há nenhuma fiscalização.
Outra questão é a mistura entre tráfico de pessoas e prostituição. O Protocolo de Palermo (2004), que baliza ações contra esse tipo de crime, define o tráfico como “o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso de força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade”. Para os críticos, o texto enquadra toda prostituição, forçada ou voluntária, como forma de escravidão sexual.
A discussão é complexa. Uma rápida comparação para fácil entendimento sobre as estatísticas do tráfico humano é que, as chances de condenação pela prática deste delito são tão baixas quanto à possibilidade de ocorrência de homicídios na Islândia ou sequestros na Noruega – nações conhecidas por estar entre as mais seguras do planeta. Se pensarmos na construção sócio, histórico e cultural das mulheres, elas sempre foram vistas como “objetos”. A submissão, o machismo e a “coisificação da mulher” tornam o aliciamento delas pelas quadrilhas de tráfico humano um alvo mais fácil. Quando falamos em travestis e transexuais, é ainda pior, porque eles são tratados como subcategoria de “coisas”.
Com o assunto a tona, um maior número de denúncias e investigações, também é preciso começar a pensar na reinserção dessas mulheres traficadas ao seu ambiente natural e no convívio social. Isso envolve os trabalhos de equipes multidisciplinares, que buscam resgatar a autoestima e trabalhar a volta dessa mulher no mercado econômico, pois muitas delas sentem culpa pelo acontecido e tem dificuldade em retomar a vida.
Antonia Braz
Palestrante, Educadora, Especialista em Gestão de Pessoas, Psicopedagoga e Pedagoga